Absurdos do Tráfico de Animais

Liberdade dos pássaros

Os pássaros em estado selvagem devem ser soltos com urgência, sem muitas burocracias, porque essa estória de perigo ao meio ambiente é balela, até que me provem o contrário.

Desde que o Brasil existe, os restos de alimentos e dejetos são jogados ou varridos em qualquer lugar do quintal, tanto que é comum se falar dos pássaros que vivem ‘as voltas dos criadouros, os pássaros livres vivem no meio daquilo, e ainda não vi mortalidade de pássaros selvagens por causa disso.

O contato é direto e não intermitente, de modo que os pássaros se comunicam uns com os outros, por todo o país. A menos que seja invisível, ainda não vi uma barreira a separar animais soltos, a não ser as cercas das fazendas.

Na natureza os pássaros encontram os seus remédios e vivem saudáveis. O mais perigoso é o contrário, quando o animal selvagem é preso, que perde as próprias defesas e ainda contaminam os nascidos em criadouros. Mais perigoso também é o desrespeito aos habitats, consequência do “progresso”, crescimento desordenado e ocupação territorial, pelos humanos. Este sim, causa mortalidade visível.

Também não importa muito se, por alguma soltura, possíveis cruzamentos possam mudar parcialmente as características de uma população. Não há prejuízo ‘a natureza se o silvestre terá menos ou mais fibra ou valentia, pior ou melhor canto. Essas características são adaptações naturais, exigidas pelo habitat em que vivem.

Na natureza os pássaros se misturam, se hibridam, se acomodam e se adaptam. Nem os pássaros alienígenas, introduzidos no Brasil, mudaram esse panorama. Até os pardais mantêm um crescimento populacional proporcional ao crescimento das cidades. Não se dispersaram pelo campo. Os nativos mais arredios, por falta de ambiente adequado, é que estão se aproximando dos centros urbanos, sem qualquer relação com as solturas.

O canário do Sul, come, nidifica, procria, vive e se comporta de maneira semelhante ao canário do Norte, respeitadas as diferenças encontradas em cada lugar. Ambos têm a mesma importância ao meio ambiente. A natureza não quer canto clássico, nem fibra para roda, mas o que importa é que o animal cumpra o seu papel no ecossitema.

O canário peruano, venezuelano, brasileiro é o mesmo. As diferenças exteriorizadas são meras adaptações ao meio em que vivem, e as denominações científicas são criações do homem, assim como existem pessoas negras, brancas, amarelas, vermelhas. São diferenças para resistirem ao frio, calor, alimentação local, mas são gente do mesmo jeito.

O mundo poderia ser igual em todo lugar, e todos seriam iguais, ou diferente em cada região, e todos se adaptando ‘a sua região de origem. Prevaleceu a última hipótese, por isso essa variação de espécies, tipos, formas e cores. A Beleza, talvez, tenha determinado que fosse assim, para a felicidade de todos.

O animal solto fora do seu habitat, com o tempo irá se adequar, se as condições não forem extremamente inóspitas, a ponto de levá-los a óbito. Se forem, irão procurar o local adequado.

Só os mansos de gaiola, que perderam as características da espécie selvagem, correm esse risco.

O desequilíbrio causado pelo aumento populacional em determinada área, em consequência de soltura, também é só teoria. As populações aumentam e diminuem conforme a capacidade do lugar e o excedente se dispersa no espaço. Se não for assim, é preciso para o país, porque os espaços estão diminuindo drasticamente, dia após dia. E não é a soltura de algumas centenas de pássaros que vai piorar isso tudo. A quantidade apreendida é irrisória, quase inexistente, em relação ao número de animais em liberdade. De onde se tira tanto para o tráfico, se tantos assim não existem?

Se é verdade que há tantos caçados, tantos traficados e tantos mortos, lógico seria pensar que, então, está sobrando espaço na natureza.

E se tudo isso não for assim, ainda temos as reservas ambientais, para suprir a falta de locais para solturas.

Tenho minhas desconfianças de que, quem é contra as solturas, esconde a intenção de ficar com os pássaros, ou favorecer quem queira ficar com eles. E a defesa do sacrifício dos animais apreendidos é somente uma forma de chocar a opinião pública, para que ela prefira a doação ao sacrifício, forma sutil de convencer, de se conseguir objetivos.

Os animais já mansos de viveiro, estes sim devem ser disponibilizados a criadores, porque o processo de readaptção é trabalhoso, caro, desinteressante e nem sempre com total eficiência. Mesmo assim, aqueles que não encontram interesse dos criadores, devem ser readaptados, a qualquer custo, para soltura. Uma pequena chance de sobrevivência, por mínima que seja, é ainda melhor do que a morte certa. E um minuto a mais de vida, representa muita coisa para aquele ser. Um minuto, também, pode representar a salvação de tudo.

É esta a minha opinião sobre o tema colocado, e com relação aos passeriformes, vejo com confiança a iniciativa da COBRAP. Será, sem dúvida, um grande avanço, pois até agora só estamos vendo “despir um santo para vestir o outro”.

Mais preocupante é a situação dos outros animais. Todo mundo se preocupa com pássaros, mas é bom lembrar que existem outras vítimas do tráfico e dos maus tratos.

Os pássaros, hoje, apesar de tudo, já podem ser eleitos os privilegiados, graças ‘a perseguição aos traficantes e o trabalho dos criadores.

Como o caso das ararajubas, em relação aos que defendem a eutanásia. Aquelas que não morrerem com o traficantes, morrerão na eutanásia. O mesmo se diga do tratamento inadequado do produto da apreensão. Tanto no caso dos ovos apreendidos em Recife, quanto no caso de animais apreendidos, que seriam condenados ‘a eutanásia (termo impróprio, usado para amenizar a atrocidade), ou levados ‘a morte por tratamento inadequado da questão, talvez alguns sobrevivessem com o traficante, enquanto que apreendidos, a morte seria certa. Como combate ao tráfico, até se poderá argumentar que seria uma medida politicamente correta, mas não há falar em piedade, quando o sofrimento e a vida do pássaro não são considerados. Essa estória de “boi-de-piranha” é pura falácia, porque para o animal sobrevivente, tudo isso faz muita diferença. “Antes magro no mato, do que vivo na boca de um gato”. Para o indivíduo pássaro, melhor vivo, e com alguma chance, e até esperança, seja com o traficante ou destinatário do tráfico, do que morto pelas mãos do poder público ou por falta de destinação adequada. Por isso é que penso que quem se incumbe em promover a apreensão, deve pensar muito na sua responsabilidade, providenciando alojamento e tratamento adequados, para não se tornar o verdadeiro algoz do animal. Não importa a este os motivos morais ou políticos da ação, mas a vida que lhe é tirada. Para ele, o assassino é aquele que efetivamente provocou a sua morte, no momento que ela ocorre, independente das razões ou motivos de estar sob o martírio de um ou de outro. Este é o lado esquecido da questão.

Escrito por Valdemir Roberto Barros, em 2/9/2003