Pingos nos is
Esclarecimento
O Sr. Luis Fernando de A Figueiredo, escreveu o artigo entitulado “O necessário pacto entre os preservacionistas e os criadores de aves silvestres”. Ficamos estarrecidos e muito surpresos com algumas colocações do companheiro Luís. Será que é essa a idéia que fazem de nós? A respeito, pedimos vênia, para tecer alguns comentários sobre o conteúdo do texto. Contudo, deve ficar claro que só falamos pelo segmento dos criadores de pássaros canoros. Assim, temos uma visão um tanto diferente sobre alguns aspectos, embora nosso objetivo seja o mesmo, o da preservação. Concordamos que muitos conhecimentos, a nível de detalhes, adquiridos no manejo diário que os passarinheiros detém sobre determinadas espécies, poderiam ser utilizados por qualquer pesquisador científico, bastaria uma aproximação entre ambos para que isso fosse concretizado. É a teoria e a prática. Seria um grande avanço. Precisamos nos despir de todo tipo de sentimentos negativos para chegarmos a esse diálogo. Quanto ao desaparecimento do bicudo e do curió das várzeas perto das cidades, podemos dizer que não foram só eles os desaparecidos, são muitos outros é todo um ecossistema que foi prejudicado. A caça predatória colaborou, sim, muito para isso, mas não é só, a pulverização com o DDT, a poluição das águas – o maior crime que se pode cometer contra a natureza – e todos os outros tipos de degradação ambiental. Por exemplo, como um pássaro que tem muita exigência com o seu hábitat, igual ao bicudo, poderia viver como outrora, na região de Ribeirão Preto SP, área detentora de um deserto verde, o da monocultura da cana-de-açúcar? Como falar em biodiversidade num lugar desses. Isto para não citar inúmeras regiões idênticas, espalhadas pelo País. E se pensarmos no tamanho do estrago ambiental que está sendo feito em grande parte do Brasil. Em apenas 500 anos quanto já foi destruído da natureza. Foram milhões de anos para a formação e poucas décadas para destruição. É muita irresponsabilidade. O que será daqui a 50 anos, ou daqui a outros 500 anos. Há alguma maneira de deter o passar do tempo? Há alguma maneira de deter o crescimento geométrico da população mundial? Há alguma maneira de fazer com que o homem não ocupe mais espaços? Será que adiantará falar em desenvolvimento sustentado, onde a experiência nos tem mostrado que, só o lucro imediato interessa. Os países mais adiantados falam muito em “preservação do meio-ambiente” – para os outros -, depois que destruíram quase todos os seus recursos naturais. Muito bonito isso. Qual será a solução, então? Como sempre dissemos, são muitas, mas certamente umas serão: a criação sempre crescente de “Unidades de Conservação” , a criação doméstica das espécies ameaçadas ou não, a educação ambiental, repovoamento monitorado, reflorestamento com espécies nativas, e outros procedimentos similares. Falando só de nossa parte; a questão passa, então, muito pelo entendimento correto que a sociedade deve ter sobre os efetivos criadores de pássaros. Do nosso lado, sabemos muito bem que, a sociedade só nos permite deter pássaros porque sabe que perfeitamente que estamos reproduzindo-os, e por isso, realizando uma tarefa das mais importantes para a preservação das espécies. Ninguém pode ter dúvida, como é óbvio, de que nossos criatórios grandes ou pequenos, sejam verdadeiros santuários, onde se pratica com o maior carinho, uma das mais nobres tarefas: a da criação de animais nativos nacionais. É um julgamento muito cruel o que está dito no texto de Luis, mas foi até bom, assim ficamos sabendo o “porque” das eventuais e muitas discriminações de que somos vítimas. Nossa colaboração, ao contrário, tem sido muito grande e ela poderá crescer se tivermos apoio dos autênticos preservacionistas. Apoio não quer dizer autorização para que haja aquele tipo de fiscalização proposta em qualquer de nossos criadouros, a não ser por quem de direito. Queremos sim, uma visita cordial dos companheiros preservacionistas, a começar pelo nosso 016-6721121, pelo do mestre Marcílio Picinini 032-2731346, pelo do Fernando Paz 031-5472756, pelo do Hélio de Paula 016-8311748, pelo de Ito da Fonseca 016-6233492, pelo de José Busnardo 016-6247545, pelo do Reinaldo Guedes 035-3411378, pelo de Brás Anastácio 011-4612802, pelo de Jorge Heusi 048-2349000, entre outros. Isso nos encheria de alegria. Estamos abertos a qualquer tipo de diálogo, queremos trabalhar juntos, em parceria. Estamos de acordo em muitas coisas; lugar de animal silvestre é a natureza. Não precisamos deles, o estoque doméstico existente é suficiente. Não se pode mais admitir a captura, não queremos de forma alguma isso. Seria um enorme contra-senso que os que praticam a reproducão doméstica estivessem a favor da captura de silvestres para comercializá-los. Uma coisa não combina com a outra. Como é que fazemos um grande investimento para montar um criadouro, passamos o dia inteiro cuidando de filhotes; não há domingos e nem feriados; não há férias e não pode haver o menor descuido; e depois estaríamos a favor ou coniventes com o tráfico ilegal de animais. Não faz o menor sentido. Queremos mercado sim, mas para o que estamos produzindo legalmente; quer atividade mais gratificante. Queremos também, mostrar com muito prazer, que estamos tirando pássaros da extinção, notadamente o bicudo e o curió. Queremos fazer o pacto, queremos o apoio de todos. Podem nos convidar para comparecimento em encontros que iremos com muito prazer, dizer o que sabemos e dizer de nossos objetivos. É só convidar quem de direito e quem estiver em condições para debater os eventuais assuntos programados, vamos trocar idéias, seria ótimo que isso acontecesse. Até hoje não tivemos conhecimento de nenhum tipo de convite para comparecermos a evento com o intuito de discutirmos assuntos inerentes. Conversamos com vários outros criadores e dirigentes e eles disseram que desconhecem qualquer tipo de convite. Estamos ansiosos para que, doravante, sejamos efetivamente convidados. Temos muito a falar, temos a dizer sobre nossa história, sobre nossas atividades que só se iniciou no Brasil, há 15 anos. Somos pesquisadores ainda, somos pioneiros, estamos aprendendo ainda e com muitas dificuldades. Só depois do ano de 88 é que, após intensas negociações com os competentes técnicos do IBAMA que duraram 4 longos anos, a questão foi regulamentada; assim mesmo, após eles ficarem convictos de que estávamos efetivamente realizando a reprodução doméstica. Hoje são milhares e milhares de filhotes produzidos. Já temos, portanto, mais de dez gerações criadas, nossos bicudos e nossos curiós passaram a ser pássaros nativos brasileiros domésticos. Tão domésticos como os milhões e milhões de exóticos criados, tipo “ägapornis”, “periquitos australianos” “canários-do-reino” , “mandarins” e muitos outros. Mas podemos fazer muito mais. Saímos da conversa e do querer fazer para a ação. Estamos produzindo muito e cada vez mais, são inúmeros criatórios que estão sendo espalhados pelo Brasil. Debaixo de muitas dificuldades estamos dando um exemplo para o mundo. Sem falar no melhoramento genético que é o grande trunfo, o grande segredo a favor da preservação, ninguém quer exemplares “sem origem” ou de origem desconhecida. Só se quer filhotes, oriundos de campeões, criados domesticamente, segurança de que ele vai aprender o canto que se quer ensinar. Se não fosse por isso, como é que um criador sobreviveria se seus filhotes não tivessem qualidade, quem iria se interessar por eles. Todos os campeões de hoje que disputam torneios são nascidos domesticamente. É preciso que a sociedade conheça o trabalho que estamos fazendo para preservar os cantos mais representativos do bicudo e do curió, tudo isso já estava extinto na natureza. Vale a pena conhecer-se a ciência que está por trás do ensinamento de um determinado canto a um filhote, aí está o “x” de nossa questão. Não estamos atrás de aves raras ou menos possuídas, a colocação não serve para nosso segmento. Pelo contrário, queremos é seleção genética a partir de pássaros muito conhecidos e campeões. Portanto o que estamos procurando, em termos de pássaros canoros é a criação de espécimens de muita qualidade de canto e de repetição. Quanto melhor, quanto mais cantor, quanto mais repetidor e quanto mais bonito cantar, mais valorizado e mais procurado. Só há isso em aves criadas, mateiros ou silvestres não servem. De outro lado, a manutenção de um criadouro custa muito, inclusive muita dedicação, dificilmente se recupera o valor dos recursos investidos, não tem problema. A maioria faz porque ama, porque gosta, porque tem prazer nisso. Como é gratificante segurar um ninho repleto de filhotes. É muita satisfação para nós. É preciso ficar claro, porém que, existem os mantenedores de pássaros que não reproduzem, não têm tempo, não têm jeito para o mister e em suma não têm condições para praticar a procriação. Mas a dedicação deles é muito importante para que todo o sistema funcione, desde que os pássaros mantidos sejam domésticos. O mantenedor, é o braço do criador, seu complemento. Eles manuseiam os pássaros criados, eles os desenvolvem. Eles os levam para passear, É gente que gosta de escutá-los cantar, é gente que gosta de participar de torneios, é gente que gosta de vê-los, de possuí-los. Que mal há nisso, é um pedacinho da natureza perto de si. Teria algum sentido criar-se centenas ou milhares de aves para possuir todas elas, só se for algum tipo de loucura. A ciclo se fecha, somos uma comunidade, o criador produz teoricamente, para o mantenedor manusear, para preservar, para manter estoques, para possibilitar eventuais repovoamentos, e sobretudo por gosta, porque é um apaixonado. Não reproduzimos animais para matá-los e comê-los, ou para arrancar a sua pele. Produzimo-os para ter, principalmente, o direito de conviver com eles. Supomos por todo o trabalho realizado que temos esse direito. E daí, está tudo resolvido? Logicamente que não. Se tem gente que teima em caminhar pela trilha do ilícito e do ilegal? A responsabilidade não é nossa. É um problema de polícia, da justiça, e da própria sociedade. As autoridades precisam agir com bastante rigor, mas deve responsabilizar aqueles que realmente tem culpa no cartório. Não podemos ser confundidos, de forma alguma, com traficantes ilegais, não somos farinha do mesmo saco. Pelo que está escrito no referido artigo e se for esse o sentimento da opinião pública, a coisa está esquisita. Está faltando uma melhor comunicação ou mesmo uma honestidade de propósitos em algum dos segmentos. Estamos muito ruins de marketing. De quem é a culpa. Alguma coisa deve estar errada no contexto. Será o radicalismo de alguns ou talvez falta de diálogo. Será que teríamos que tomar alguma iniciativa para mudar isso, será que os criadores precisariam se unir em torno de objetivos comuns para que passassem a ser devidamente respeitados por todos? Tudo tem que estar esclarecido, urgentemente. Qual é a responsabilidade da imprensa nisso tudo? O que estamos fazendo está sendo entendido como plenamente correto? Se há falhas, onde estão? É isso que a sociedade espera de nós? Onde queremos chegar? Nosso trabalho é ou não importante para a preservação? Sabemos que sim, mas toda a sociedade é que deve saber que sim. Alguém não está sendo claro em suas intenções ou não há muita transparência naquilo que está sendo realizado. Não tem mais jeito vamos sacudir a poeira, conversar muito, dialogar, discutir a questão e de uma vez por todas colocar os pingos nos is. Dessa forma, se tudo isso for feito e se todos os envolvidos participarem do entendimento, certamente, o companheiro Luís não precisará voltar ao assunto daqui a 11 anos.
Escrito por Aloísio Pacini Tostes, em 2/9/2003