Guarda de Animais Silvestres
Proposta de Resolução CONAMA
CONSIDERAÇÕES SOBRE A PROPOSTA DE RESOLUÇÃO A RESPEITO DA GUARDA DE ANIMAIS SILVESTRES
O leitor mais atento, mais prudente também, em todo e qualquer diploma legal, deve ir além, ou melhor, até o final do texto, para compreende-lo, sob pena de distorcer, segundo visão própria, o conteúdo da norma. Pode-se, também, é claro, deliberadamente, construir uma interpretação ou uma idéia com a finalidade de convencer aquele leitor distraído em concordar com essa idéia, uma forma de alienação do juízo alheio. Basta observar, isto sim, a comparação acima – porém sem julgamento a quem tenha redigido o texto, sem ofensas e agressividade, porque neste caso seria dirigido diretamente ‘a pessoa física, o que, em tese, configurar-se-ia crime contra a honra, com pena agravada se a vítima for funcionário público no exercício da função ou em razão dela. Não seria de bom alvitre criticar aquilo que se julga crime, conforme o seu ângulo de visão, com palavras que eventualmente poderiam também ser consideradas como tal.
De outra parte, a democracia se exerce, principalmente, com respeito ‘as pessoas e a ordem legal, na qual se inclui a apresentação de projetos legislativos. Ninguém, em se tratando do animal humano, pode defender outras espécies se não respeitar a sua própria espécie. A educação é requisito essencial para a conscientização. A truculência só produz confusão e anarquia. A História, ora invocada, ao referir-se aos heróis e mártires do passado em relação ao presente e futuro, demonstra isso claramente.
É por isso que devemos respeito a todos, sem discriminação. Até ‘aquelas pessoas condenadas definitivamente por crime, o nosso respeito é devido. Para elas, a pena, que vem descrita na lei, mas não o desrespeito, que não é previsto como pena. Da mesma forma o respeito aos cidadãos de bem, que elaboram seus pareceres conforme suas atribuições legais, é de rigor. Sem esta observância, antes, durante qualquer debate, a decisão não pode ser democrática. Depois da decisão, não cabe a quem teve livre acesso aos debates e não exerceu seu direito de apresentação de propostas e voto, a crítica negativa. Para estes ela, a decisão, toma o invólucro de soberana, pois, aqui sim, aplica-se o entendimento de aquiescência, diante da verdade que consente quem se cala.
O argumento de não participar sob alegação de conivência cai por terra dentro do regime democrático. Entendimento diverso seria impor aos nossos parlamentares e partidos políticos, cujos ideais divergem de determinados projetos, que deixem, os primeiros, suas cadeiras, renunciando ao mandato e aos partidos que se afastem ‘a participação política, ou serão considerados coniventes com a aprovação daqueles projetos. Mas ao contrário, é na participação que se demonstra sua verdadeira ideologia, seu verdadeiro pensamento, suas verdadeiras intenções, através da apresentação de emendas e votos. Depois, a decisão será soberana.
De se lembrar, ainda, que não é somente um partido político que representa a opinião de toda a sociedade civil, como não é somente uma organização não governamental, ou todas elas, que a representa (a opinião de toda a sociedade civil). Destarte, os parlamentares, agindo dentro dos preceitos legais, representam a sociedade civil por mandato. Por conseqüência, os atos daqueles a quem a lei, aprovada e sancionada, confere o direito e o dever de elaborar uma proposta de resolução, são considerados legítimos, como legítima é a proposta e deve ser respeitada, ainda que dela discordemos. Podemos, sim, discordar e manifestar essa nossa discordância, tentar modifica-lá com argumentos sólidos, baseados no verdadeiro espírito, na verdadeira redação e com o devido respeito que rege as relações de convivência social.
De qualquer modo, a se pretender realmente uma consulta ‘a sociedade, todas as leis, no seu sentido amplo, e especialmente esta resolução, deveriam ser aprovadas por plebiscito, como no caso das armas, com os conseqüentes gravames econômicos ao Estado. Seria a paralisação do Estado para tantas realizações de consultas públicas.
Não vi na redação qualquer palavra que autorize o termo de guarda a traficantes, como foi divulgado.
Seria bom que os traficantes tivessem sido contemplados, mas com relação assinada dos animais encontrados, marcação o menos inviolável possível – bastaria uma forma de tornar antieconômica sua remoção -, com a nomeação judicial de fiel depositário, fiscalização periódica (exemplo: pelo menos uma vez a cada 3 meses, podendo ser mais de uma vez e sem limite de quantidade de vezes, porém sem dia e horário marcados), impedimento de incluir novos animais na relação e prestação de contas dos animais desaparecidos da lista encontrada. No caso de óbito, laudo de necropsia e atestado medido-veterinário realizado por profissional habilitado pelo IBAMA Se é medido-veterinário, obviamente que deve ser habilitado, mas não somente pelo Conselho ao qual pertence. Deve estar habilitado também pelo IBAMA). No caso de desaparecimento, como fuga, por exemplo, Boletim de Ocorrência policial, indenização ao Estado pelo descuido. As mesmas preocupações devem existir quanto ao tratamento dedicado aos animais sob a guarda do depositário. Enfim, criar-se instrumentos que causem prejuízos ao traficante, tornando-se o tráfico uma atividade antieconômica. Essa seria a melhor forma de desestimular o tráfico.
Neste caso, as entidades ambientalistas poderiam colaborar melhor e efetivamente, em parceria com o Poder Público, contra o tráfico de animais. De outro modo, causaria o efeito contrário.
Se tirar um animal inapto ‘a readaptação ao ambiente de origem, de um cidadão não traficante, além de oneroso ao Estado, aquele (o cidadão) pode simplesmente adquirir outro e, com isso, alimentar ainda mais o tráfico. A guarda legalizada, portanto, a não traficantes, é medida economicamente viável, salutar e inteligente para o combate ao tráfico de animais silvestres.
Ironicamente a ironia, dentre todas as outras, de comparar a guarda de animais com o tráfico de drogas, apenas fortalece a proposta de resolução apresentada.
Efetivamente a lei penal separa os traficantes de drogas dos usuários, abrandando a pena destes em relação ‘a pena daqueles. A particularidade a favor do guardião de animais é que no caso das drogas o usuário é consumidor constante, aquele que efetivamente alimenta o tráfico. O animal de estimação, ainda que de origem silvestre, não é objeto de consumo do guardião. O caçador que abate o animal para consumo talvez esteja mais próximo da comparação ao consumidor de drogas, com a diferença de que animal não é droga e muitas vezes pode ser uma necessidade humana de alimentação. É como o caso da pesca autorizada, atividade extrativista, contra a qual não vemos tanta reação e tanta defesa por parte das instituições ambientalistas. Mesmo assim, seja guarda ou pesca, está longe de se comparar com o tráfico, de tal sorte que o guardião merece com justiça um tratamento diferente daquele imposto ao traficante, tal como a lei penal difere o tratamento e as penas entre traficantes e usuários de drogas. E é esta distinção que a proposta de resolução oferece.
As supostas ou hipotéticas conclusões de que todos os mandatários de cargos públicos e eleitores, enfim, a sociedade organizada, toda ela, todos os cidadãos, sejam ou venham a ser desonestos, corruptos e venais. Eu costumo pautar a conduta alheia pela minha, por aquilo que sou e por esta razão sou partidário da opinião de que todos são corretos até prova em contrário. Aos incorretos, a lei.
Entretanto, ‘aqueles, os políticos, cabe a defesa de suas pessoas, naquilo que se sentirem atingidos.
Como eleitor eu ainda creio que a grande maioria dos cidadãos seja digna e correta. Não é assim tão tola a ponto de colocar em risco os interesses coletivos em troca de mínimos favores. E nem precisa, pois ninguém entrega algo de estimação senão coercitivamente. Mesmo acreditando que o voto não é mercadoria, se, porventura, alguém quiser fazer dele objeto de troca, há muitas outras coisas a oferecer.
A preferência pela espécie de animal depende de fatores como cultura, identificação, capacidade, gosto, comportamento, despesas e tantos outros. É difícil convencer alguém que gosta de uma determinada espécie a não possuí-lá ou toca-lá por outra. Isto em se tratando de espécies. Tratando-se do animal, em si, quando a pessoa desenvolve uma estima especial, uma relação de amizade ou amor ao bicho, é quase impossível. Possível é que num determinado momento se possa convencer o “dono” do animal a toca-lo, ou substituí-lo, no caso de perda, por outro parecido, que lhe agrade, através de aquisição legal. Eu acredito que seja esta a grande maioria dos casos e não de traficantes, receptores de produtos de crime. Acredito na boa índole, na boa-fé dos brasileiros, em geral, e nos criminosos como exceção. Generalizar é imprudência que pode causar prejuízo maior.
As denúncias de corrupção e outras atividades criminosas, notadamente mostradas através da Imprensa, abrange todos os setores, em todas as atividades, inclusive algumas ONGs. E não é por isso que iremos julgar todas elas pautando-nos nos erros de uma ou outra, que caracterizam exceção em relação ‘a maioria.
Observa-se, pois, que por todos os ângulos que olharmos, não conseguimos ver somente criminosos. Tampouco nos detentores irregulares de animais silvestres podemos ver somente traficantes. É impossível impingir a todos a mácula de criminoso vil e hediondo. Mais importante o controle
O importante é combater as causas e criar meios inibir as atividades criminosas. A guarda, neste caso, é um desses meios.
Apesar de tudo, não vejo em que ponto as nossas instituições de criadores legais de pássaros possam se preocupar a não ser com o nosso sentimento de proteção desses inocentes animais contra os “campos de concentração” para onde são levados e contra os defensores da eutanásia em massa.
Somos criadores legais, associados a entidades também legais e organizadas, não temos animais irregulares, não nos interessa a guarda de animais silvestres, temos arrecadação própria, não dependemos das finanças de empresas nem do governo – ao contrário, pagamos tributos -, nossos representantes têm outras atividades econômicas ou são aposentados, não recebem pró-labore, salários e quaisquer verbas das associações, federações e confederação porque temos sustento próprio, não temos nenhum bem nem ajuda financeira pagos por nossas entidades aos seus respectivos presidentes, diretores, consultores e ocupantes de outros cargos. Nossa arrecadação vem exclusivamente das anuidades e doações espontâneas dos próprios associados. Ninguém de nós tem cargos nas nossas entidades como meio de vida, sequer. A nossa arrecadação é utilizada para pagamento de empregados, tributos, obrigações legais, fornecedores e realização de eventos. Mesmo assim, tanto os participantes quanto os organizadores de eventos, dirigentes e representantes das associações, federações, confederação, pagam do próprio bolso suas viagens, estadas e despesas de participação nos eventos.
Não estamos imunes ‘a prática de alguma ilegalidade por algum dos nossos. Como eu disse, isso não depende da classe, nem do conjunto de pessoas, mas da personalidade do infrator, também exceção.
O tráfico ou a posse ilegal de animais não interessa a nossa atividade, a não ser na nossa missão de combate-los, que é não é dever só nosso, mas de todos e de minimizar o sofrimento de qualquer espécie animal, no que a guarda legal poderia ajudar.
A par disso, podemos apenas e não obrigatoriamente receber animais por entrega voluntária do Poder Público para proteção, cuidados e reprodução. É uma forma de colaborar com o Poder Público na preservação das espécies. Na verdade, é mais um encargo que nem todos podem suportar.
Podemos, isto sim, oferecer aos interessados em manter ou criar legalmente animais da fauna indígena opções de aquisição legal, que também é forma de combate ‘a captura e ao tráfico de pássaros silvestres.
Roberto Marcelo Ribeiro
Escrito por Roberto Marcelo Ribeiro, em 7/5/2006