Flertes

Eu vi, ele me viu

FLERTES

Eu vi o pardal no quintal, sobre o alambrado,

trazia no bico, assanhado, um raminho

para, dentro do forro da casa, construir o seu ninho.

Ele me viu, disfarçou, olhou para os lados, desconfiado,

mas não voou, plantado continuou,

até que, achando-me discreto, o beiral adentrou.

Eu vi o beija-flor pequenino, multicor, ágil,

brilhoso ao sol, tatalando as asas, parado no ar,

sugando as flores, que amor, para se alimentar.

Ele me viu, ameaçou fugir, interrompendo a refeição,

deu um currupiu, estancou, recomeçou

a beijar a planta e só depois, saciado, para longe voou.

Eu vi o casal de maritacas, no alto da árvore,

no final da tarde, barulhento, fazendo arruaça,

parecendo crianças felizes num banco de praça.

Ele me viu, o macho creio eu, pois logo foi o primeiro

 a levantar vôo, rodopiando no ar, hostil,

depois a dupla, seguindo o instinto, bateu asas e fugiu.

Eu vi o sabiá do campo, o João de barro, o sanhaço,

 o pombo da mata, o tico-tico, o papa-capim,

pousados, piosos, na primavera do nosso jardim.

Eles me viram, tenho certeza, pois cada um, desconfiado,

pelo movimento, pude notar, ameaçava partir,

mas não o fazia, o sol se escondia, era hora de dormir.

Eu vi na sombra da noite, assim que cessou a chuva,

 um sapo, nem grande nem pequeno, de porte médio

muito à vontade, parecendo se achar livre de assédio.

Ele me viu, mas permaneceu no lugar, quieto, imóvel,

nem os latidos da cachorrinha Dolly pareciam incomodar,

talvez resistisse por não ter como os pássaros asas para voar.

Eu vejo a toda hora, por singular e divino privilégio,

os habitantes da fauna e da flora, que por sua rara beleza

me atraem para os abraços e afagos da mãe natureza.

Eles me vêem, alguns ainda fogem, obedecendo o instinto natural,

não sabem o apreço, o carinho e os desejos meus

de vê-los libertos e amá-los como obras de Deus.

Alceu Sebastião Costa

 Escrito por Alceu Sebastião Costa, em 1/8/2007