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Plano de Manejo Sustentado de Aves Nativas

Uma solução ???

Aloísio Pacini Tostes – Ribeirão Preto SP

O tema continua, infelizmente enquanto não encontrarmos saída inteligente e exeqüível para a questão da preservação de nossas aves brasileiras, não há como falar de outros aspectos que envolvem o problema. O que temos até agora presenciado é cada segmento ou cada grupo de interesse organiza palestras, seminários ou outros eventos escritos em inglês para tentar conseguir espaço, marcar posição ou melhorar sua própria imagem. Mesmo que muitas vezes haja a melhor das intenções ou honestidade de propósitos, ainda não vimos nenhum real resultado positivo em tudo que constatamos, lamentavelmente.

A degradação ambiental crescente continua de forma avassaladora, o desastre ecológico que fizemos nos últimos cinqüenta anos nesse País é de estarrecer; o pior , não há sinais que haverá um arrefecimento, pelo contrário as perspectivas são negras; o aumento gradativo da população mundial e a conseqüente busca na exploração de áreas rurais intactas por lavouras racionais altamente poluidoras; a poluição das águas dos rios; as queimadas destruidoras de grandes áreas de vegetação nativa; a alteração do clima e de demais condições ambientais; o consumismo exagerado e cada vez maior das grandes potencias; tudo isso está nos levando para a situação inexorável do grande perigo de se exaurirem os recursos naturais e da impossibilidade de haver vida na terra.

Antes, porém haverá uma grande opressão dos mais poderosos contra os mais desprovidos; nós aqui iremos sofrer muito – e já estamos – com a forte pressão que se estabelece na busca da necessidade de extrair-se os insumos e produtos naturais de toda sorte: animais, plantas, minérios, água potável, etc….., e quando nos pagam, preços vis, pagam com um mão e tiram com a outra; quanto tempo a nossa natureza vai ainda agüentar essas agressões???

Temos que agir, buscar saídas, dar um basta no tumulto no “faz de conta” e na insanidade coletiva que se estabelece na cabeça das pessoas, e ainda, com o grande perigo de sofismas nortearem procedimentos e o conseqüente risco de estamos trabalhando inadvertidamente para ajudar a acelerar a vinda da devastação total. Na nossa visão, quando falamos nesse caos iminente queremos dizer a extinção de várias espécies de animais e plantas. De que adianta, ficarmos falando, discutindo, as vezes só filosofia, poesia, coração, imaginação, cada segmento se fecha, não fala com os outros e pensa que vai resolver o problema sozinho, num passe de mágica.

Estamos cansados de ver, ouvir e saber de encontros desse ou daquele respeitável setor, há muitos anos repetir evidências de situações que todos sabemos que existem, especialmente quanto ao tráfico ilegal e degradação ambiental, ninguém é punido, não existe a direção; o pior o quanto de dinheiro público é gasto; e nada.

Falando só das aves e das aves silvestres e nativas brasileiras, compete tomarmos ações concretas, efetivas , inteligentes e amplas sobre todos os aspectos que envolvem a vida selvagem e a exploração doméstica. Então, com o intuito de discutir o futuro, e as perspectivas que temos a respeito da preservação delas, teremos que iniciar promovendo eventos do tipo abaixo especificado, onde discutiremos as mais diversas situações a que estão envolvidas e no final produzir documento a partir de sugestões/caminhos viáveis a seguir no sentido de efetivamente atingir o objetivo de todos: evitar a extinção das respectivas espécies brasileiras, a saber: .

Temas:

1 – A crescente degradação ambiental; – queimadas, poluição das águas dos rios, queimadas, desmatamentos – Como conservar? A legislação existente – Principais motivos dos descumprimentos; Apresentar propostas de solução- Eng. Florestal , gestão ambiental

2 – A ave em seu ambiente natural – riscos e conservação – Apresentar propostas de solução – Biólogos

3 – O tráfico ilegal, combate e punição – – Propostas efetivas de ação e solução; abordagem da mídia – Representante de Ongs, mídia e polícia ambiental e federal;

4 – O processo e o destino das aves em situação irregular ou apreendidas;

– Centro de Triagens – Zoológicos depósitos, depósitos de aves; cadastro dos indivíduos – solturas aleatórias/encaminhamento – Propostas de solução – Representantes do poder público e privado e ONgs

5- As formas de criadouros (Científicos, Conservacionistas, Comerciais e Amadoristas) – Zoológicos –

– Sistemas de marcação – cadastro dos indivíduos – compromisso com a reprodução e resultados práticos efetivos e dificuldades encontradas no processo; comercialização das aves – Propostas de solução – Representantes de cada segmento;

6 – Aves ameaçadíssimas de extinção – Ação conjunta visando sua preservação – Propostas de solução —Representante do setor público e privado – comunidade acadêmica;

7 – O processo de reintrodução – viabilidade na execução – propostas de solução

Representante do setor público e privado – comunidade acadêmica

8 – A ação do IBAMA;

RPPNs–Parques Nacionais – Regulamentação através de Portarias e IN–Fiscalização/Sistemas de controle – registro dos indivíduos; Propostas de solução

Representantes do IBAMA

9 – O Ministério Publico

– atuação preventiva da justiça – punição efetiva aos responsáveis pelas agressões;

Procuradores estaduais e federais

10 – Numa visão de futuro – preservação e conservação – Como a sociedade poderá atuar em conjunto a fim de buscar a efetiva conservação das espécies utilizando as formas de preservação como os Criadouros registrados, as Unidades Conservação e a manutenção dos ambiente naturais ora existentes;

Discussão em plenária – extração do documento com base em obrigatórias sugestões de todos os envolvidos.

Tomara que nossa proposta não seja tomada com ceticismo por nenhum dos setores implicados, porque o que na verdade estamos propondo seria uma experiência inédita, sem a exclusão ninguém; só o interesse público está nos guiando e logicamente o grande interesse de todos nós que cultivamos, criamos e amamos nossas aves nativas brasileiras. lagopas@terra.com.br

Escrito por Aloísio Pacini Tostes, em 6/10/2003

O Canto do Curió

Curió Matador

O Canto do Curió

por André Felipe de Andrade

Alfredo chegou em casa entusiasmado. Acabara de passar no mercado da Madalena e trazia nas mãos uma gaiola com um curió. A compra daquele pássaro era um sonho acalentado há muito, que só foi possível após um árduo trabalho de convencimento da sua esposa, D. Conceição. Mulher piedosa e sensível, ela achava uma judiação deixar um passarinho engaiolado.

Mas atendeu aos apelos do marido. Afinal ele era aposentado, e precisava de algumas distrações além das partidas de dominó que jogava todo santo dia na calçada de um bar da rua em que moravam, no bairro de Areias. O casal vivia ainda com uma filha solteira, Carminha, com seus vinte e tantos anos.

A gaiola foi colocada no terraço, não sem uma detalhada explicação a respeito das qualidades artísticas daquela espécie de passarinho. O curió era uma ave tipicamente brasileira, de canto fácil e perfeito. D. Conceição desconhecia aquela erudição de seu marido e, com a segurança dos mais de trinta anos de convivência, apostava que ele havia aprendido aqueles ensinamentos com o vendedor com quem fizera negócio.

No início, todos ficaram ansiosos em ouvir o canto da ave. Mas o curió mudo chegou, mudo ficou. E os dias foram se passando para desespero do velho Alfredo. Sentindo-se lesado após uma semana de espera, o velho foi então ao mercado. O vendedor deu explicações as mais variadas, que sempre responsabilizavam o dono do animal. Homem paciente, Alfredo memorizou todas as recomendações e as cumpriu à risca. Mais alguns dias e nada. Aí já era um abuso, pensou o aposentado. No exato momento em que se dirigia ao terraço para pegar a gaiola e devolver o pássaro, a casa foi tomada por uma música rara: O curió cantou. E que beleza de sons, que canto melodioso ! Alfredo ficou estatelado e até uma lágrima apareceu em seu olho. D. Conceição veio correndo da cozinha para ouvir de perto aquela beleza. Mas de súbito, a velha pôs a mão no peito, e num grito caiu ao chão. O curió parou de cantar. Alfredo ficou alguns segundos em estado de choque, para em seguida se abaixar e ver que sua esposa não mais respirava. Infarto fulminante.

Os dias que se seguiram ao passamento da mulher foram de grande vazio. Alfredo estava inconsolável, e demorou a perceber que mais uma vez o curió havia voltado ao estado de completo silêncio. Alguns dias depois, o velho decidiu ir com sua filha passar alguns dias na casa do filho mais velho. Alfredinho era casado e morava em São Paulo. Era uma maneira de atenuar um pouco a dor da saudade da esposa. O curió ficou aos cuidados de uma vizinha, D. Neném.

A viagem transcorria tranqüilamente, com passeios e velhas lembranças. Porém, um belo dia, um vizinho ligou para contar que o filho caçula de D. Neném havia morrido. Era um rapaz de uns dezoito anos, muito saudável, e a causa da morte ainda não fora esclarecida. Sabia-se que ele havia sido encontrado morto na sala de sua casa, aparentemente de causa natural. Alfredo decidiu voltar de São Paulo com Carminha, a tempo de pelo menos assistir à missa de sétimo dia. Lá chegando, o velho encontrou um grupo de vizinhos que comentava um fato interessante: No dia da morte do rapaz, o curió havia cantado com desenvoltura, deixando todos que o ouviram encantados, inclusive o filho de D. Neném. Um vizinho perguntou a Alfredo se aquela circunstância não lembrava a da morte de sua Conceição. Alfredo era nada supersticioso e disse que tudo havia sido uma triste coincidência. Onde já se viu curió agourando gente ?

Aos poucos a vida foi voltando ao normal para Alfredo e sua filha. As partidas de dominó, as caminhadas na praça, as partidas de futebol do seu time do coração serviam para aliviar a saudade da esposa. Um belo dia, quando voltava para casa, o aposentado ouviu da calçada uma música doce e belíssima. O curió estava cantando ! Por um instante Alfredo esqueceu-se de tudo, fechou os olhos e se deleitou com aqueles doces trinados. Ao entrar em casa, deu de cara com a filha caída. O velho ainda teve tempo de ouvir a filha dizer num suspiro: “Pai, vou feliz à casa do Senhor. Encontrarei minha mãe. Os anjos me levam.”

Não era fácil perder mulher e filha em menos de um ano. Por isso os vizinhos não se surpreenderam quando no velório de Carminha Alfredo passou mal. Era um derrame cerebral. O velho foi internado na U.T.I. de um hospital recifense e lá ficou por uma semana. Mas ele tinha uma saúde de ferro e resistiu. Com todo apoio da irmã, D. Gracinha, ele foi transferido para um quarto do hospital. O aposentado ficou sem os movimentos das pernas e de um braço. Teria que entrar num longo processo de recuperação. Quando teve alta, sua irmã achou por bem levá-lo para a residência dela em Casa Amarela.

D.Gracinha foi à casa de Alfredo para pegar suas roupas. E viu o curió. Teve a idéia de levar para a sua casa, com a finalidade de distrair o irmão. Ela decidiu fazer-lhe uma surpresa: pôs a gaiola dentro do quarto onde o velho dormia. Ao abrir os olhos, a primeira coisa que ele viu foi o curió. Com os olhos arregalados de pavor, ele deu um suspiro. Como se fosse combinado, na mesma hora a ave começou sua doce cantoria, como nunca havia feito antes. Nunca em sua vida Alfredo tinha escutado um som como aquele. Nem das vezes anteriores em que o pássaro havia cantado. Música celestial, que embalou Alfredo naqueles que foram seus últimos minutos de vida.

Escrito por André Felipe de Andrade, em 6/10/2003