Não Prenda e Não Solte

Essa lógica está correta. Hoje, o fruto da criação doméstica e os espécimes que estão na mão dos criadores não podem ser soltos. Essa é a questão. Muitos falam em não manter animais em cativeiro e esquecem dos milhões de indivíduos que estão em poder dos criadores, que reproduzem regularmente e que não podem ser soltos. Sem dizer dos considerados domesticados oficialmente. Então, a de se levar em conta esse importante aspecto. Os animais silvestres que estão livres na natureza, são intocáveis e devem lá permanecer superprotegidos. Porém, aqueles que são produzidos domesticamente, dentro dos princípios da sustentabilidade, observado seu respectivo bem-estar, servem para atender a demanda, gerar empregos e rendas, bem como efetivar os esforços de conservação das espécies ameaçadas com reais expectativas de reintroduções oficiais autorizadas.

Não Prenda mas Também Não Solte

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IMPORTANTE: Reintrodução de Passeriformes – Texto de 1996

Vejam que faz tempo que a preocupação de nós criadores a respeito da soltura de passeriformes é pretensão como forma de completar o ciclo da atividade que tem o objetivo maior a conservação das espécies com a criação ex situ e in situ. Leiam com atenção o texto de Aloísio Pacini Tostes escrito para a Revista AO Atualidades Ornitológicas em 1996.

 

Atualidades Ornitológicas –  N. 72 – Julho/Agosto de 1996 – pág. 5

O repovoamento é possível?

Aloísio Pacini Tostes – Ribeirão Preto-SP

São vários os motivos porque se faz a criação doméstica, ou seja: por hobby de alguns, para praticar a seleção genética e fabricar campeões, para atender a demanda de forma legal, para ganhar dinheiro com uma dignificante atividade, para evitar a extinção das espécies, entre outros.

Todavia, um objetivo importante terá que ser o da reintrodução em ambientes naturais, senão o grande mérito de todo o processo de reprodução doméstica estaria sendo colocado de lado. Contudo, da intenção à ação há um caminho muito difícil a seguir, são tantas as dificuldades que chegamos a ter dúvidas, pelas condições atuais, de sua praticidade.

Senão vejamos. Aonde realizar a tarefa? Em qualquer Parque Nacional? Numa fazenda? Em algum local escolhido aleatoriamente. Certamente que não. É preciso fazer um estudo muito cuidadoso sobre o local. Quem ficaria encarregado de efetivar a soltura? O próprio criador? Estudante interessado? Alguma organização ecológica? Alguma escola para educar alunos? Algum guarda-florestal? Certamente que não. É preciso monitoramento e contar com o auxílio de pessoas abalizadas e muito bem preparadas para que tudo dê certo. Qual a época melhor? Qualquer mês do ano? É sempre no mês xxx? Qualquer hora do dia? Certamente que não. E preciso examinar as condições do tempo, temperatura, chuvas, ocorrência de alimentos naturais, muda de penas de cada pássaro e assim por diante.

Como fazer? É outra dificuldade, é preciso uma sensibilidade muito grande, cada subespécie tem um modo de vida, cada uma tem uma particularidade que deve ser observada. Alguns pássaros como o bicudo exigem uma área muito grande de terra para que possa lançar seus vôos quilométricos. Como é que poderemos soltar bicudos em São Paulo ou em regiões de população numerosa. Já quanto ao fornecimento de exemplares para nossa pretensão, achamos que essa é a parte mais fácil, porque em contatos que tivemos com vários criadores muitos estariam dispostos a fornecer os pássaros para o mister. Além disso, todos sabemos que é muito grande a quantidade de pássaros apreendidos pelos fiscais e polícias ambientais dos Estados, muitas vezes em condições precárias. Na maioria das ocorrências eles, também, não sabem exatamente o que fazer com as aves. Não há “Centro de Triagens”. Em alguns casos são mal tratadas, passam fome ou morrem depois de aprendidas. Um pássaro não pode ficar mais do que 2 horas sem beber água, não pode tomar vento, não pode ficar sem comer, não pode sentir calor excessivo e tudo o mais, será que todos tem consciência e podem agir tempestivamente para intervir de forma adequada conforme o caso possa exigir?

Nosso País é muito grande, são espécies que ocorrem no Nordeste apreendidas no Sul, são outras do Pantanal recolhidas em São Paulo, e assim por diante. Não raras vezes, ficamos sabendo que essas aves foram soltas precipitadamente em locais inadequados sem qualquer critério. Se já foi um enorme prejuízo sua captura não se pode aumentá-lo justamente se praticado por órgãos que tem a função de cuidar do assunto.

Mas a questão mais polêmica é quanto às subespécies, onde vamos liberá-las. Não bastasse as divergências existentes na correta descrição da distribuição geográfica e das características dos pássaros. Senão vejamos, vamos falar apenas de três pássaros que conhecemos bem. Sobre o canário-da-terra, “Sicalis”. Não pretendo entrar na questão chamada de classificação científica, parece-nos que ainda faltam algumas definições. No Rio Grande do Sul, existe um tipo de canário macho que tem o cravo da cabeça bem vermelho, as costas de penas bem preta, a canária e sempre parda branquinha. A cabeça redonda os olhos grandes. Em Santa Catarina, ocorre o canário da praia, pequeno com um cravo bem leve e a fêmea é sempre parda branca sem risca preta nas penas, conhecido também como canário da praia e o mais interessante são os canários de cabeça preta existentes em Florianópolis. Já no Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, é o canário “corujo”, pequeno, muito cantador, de voz fina, é de um amarelo inteiriço sem cravo, a fêmea é sempre branca e bem riscadinha pelo corpo, conhecido como o canário do pantanal. Em São Paulo, Minas e Goiás, ocorre o canário mais comum o macho é amarelo com o cravo vermelho e penas escuras nas asas e a fêmea é de cor amarela uniforme depois de virada. Existe ainda nestas regiões o tipio, amarelo com a ponta da rabo branco. O canário do campo, o citrina um o canário do porte mais belo, amarelo esverdeado. Nas margens do Rio Urucuia o canarinho miúdo esverdeado, muito parecido com o do Rio Araguaia. No Maranhão e Piauí o famoso “Cochicho”. No Nordeste do Brasil, o belo canário nordestino, especialmente o do Ceará, o macho com sua cor amarela, as asas claras e a fêmea corpo. Não bastasse isso, surge agora o canário peruano, muito diferente, grande, enorme, do olho preto, bico grande, canto forte e comprido, meio metralha, apreciador de arroz em casca. No curió, embora a classificação científica não considere, ainda, temos certeza que o curió da região de Paranaguá e das Serras Catarinenses não são da mesma subespécie que os de Goiás. Como também o de certas regiões do Maranhão. No bicudo aí a coisa fica ainda mais difícil ainda, são 8 subespécies catalogadas, algumas vivendo, na natureza, próximas da outra.

A verdade é que se tivermos que observar, com rigor a questão da distribuição natural, provavelmente quase nunca poderemos fazer a esperada e necessária “reintrodução”. Sugiro, então que sejam desde já escolhidos locais para efetivar nossas proposições. Na região oeste da Bahia existem áreas de terra muito adequadas para se fazer uma “Unidade de Conservação” para esse mister. Outra ação importante seria que o próprio IBAMA criasse um “grupo de trabalho” com a função de preparar um plano de repovoamento para áreas adequadas. Num trabalho conjunto, temos a certeza que muitas pessoas do setor privado estariam interessadas em colaborar. Poderia até utilizar os recursos arrecadados com o pagamento das DUA pelos sócios e pelos clubes de ornitofilia. Precisamos fazer isso, vamos organizar a coisa, sem radicalismo e sem sensacionalismo. Não podemos mais esperar. Precisamos provar a todos que o repovoamento é possível e que somos capazes de encontrar soluções para essa difícil mas não impossível missão.

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