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A lida com canários da terra

Aspectos do Manejo

Eu não tenho experiência em roda de fibra, mas na criação de mutações ainda não vi nenhum canário “femear” com outro mutante. Até com as fêmeas é uma dificuldade fazer o cruzamento, porque nem macho mutante com fêmea mutante se reconhecem. Tem casos que a fêmea dá gala, mas o macho não quer. Então, temos que usar uma opção entre várias, como: 1) habituar desde novo o macho a galar qualquer fêmea mutante; 2) habituar desde nova a fêmea a aceitar qualquer macho mutante; 3) formar um casal e mantê-los acasalados; 4) pintar a fêmea mutante ou o macho mutante; 5) fazer o cruzamento bem cedo, ainda meio no escuro (às vezes dá certo). Estes são alguns dos artifí­cios que eu uso. Acredito que você tenha também que usar alguns “truques”.

Raramente, como exceção, eu vejo CT macho galar qualquer fêmea, até de CR, e de todos que vi, são os canários mais fracos (corridos).

Há até casos mais interessantes: o Fuji tem uma canária que, ao que tudo indica, não alimenta os filhotes mutantes. Eu tenho uma fêmea mutante que cuida bem de todos os filhotes até a saí­da do ninho. Quando saem, ela mata os filhotes mutantes e cuida somente daqueles de cor normal.

Acredito que isso faça parte do processo de seleção natural, já que os mutantes seriam uma anormalidade, o que faz com que nem os de cor normal, nem os próprios mutantes reconheçam os mutantes, não somente por sexo, mas também, na maioria das vezes, como da mesma espécie.

Concluo, portanto:

1) Os mutantes não interferem no rendimentos dos demais canários, na roda de fibra, salvo raríssimas exceções (em tudo há exceção, por isso que existem regras), e nas exceções deve ter até macho que “femeia” com outro (o tipo que o Augusto/Ibitinga procura – risos), então para um desses, tanto faz que o seu vizinho seja mutante ou não;

2) canário de roda, normalmente não é “femeado” ou mesmo que seja, é agressivo com qualquer fêmea que não seja a sua. Quando “femeia”, esse comportamento não dura muito, ainda mais com outros cantando, que deixam ele ainda mais bravo (até com sua fêmea, se for o caso);

3) Para quem faz treinamento no mato, nota-se que o canário fica disputando com o macho livre e não “femeando” com a fêmea livre, quando tem um casal por perto;

4) canário bom de roda, entre tantos, não vai “amolecer” por causa de alguns mutantes por perto, e mais ainda se os mutantes estiverem cantando.

Mas sempre tem algum fator a justificar o fraco desempenho: “o canário não está no seu dia”; “o vento”; “o frio”; “a chuva”; “a roda mal feita”; “a roda de fora”; “a roda de dentro”; “os transeuntes”; “a pomba que voa no recinto (ou sobre a estaca)”; “o avião que passa rasante (que quase matou o Faxina de medo do Guga assustar, em Ribeirão – o Faxina emudeceu e o Guga continou cantando, sequer cortou o canto, não foi Claudiney? … risos)” etc.

Se for considerar todos os fatores, os mutantes, se assim podem ser considerados, tornam-se insignificantes e precisaria criar um sistema e um regulamento para cada pássaro individualmente.

O que falta, em muitos casos, penso eu, é uma melhor preparação do pássaro competidor, para enfrentar toda e qualquer situação possí­vel.

Veja um exemplo, comum com os curiás, principalmente os pardos, na estaca de canto (que á o que mais tenho acompanhado): os curiozeiros treinam os pardinhos para passear de mão, de carro, encapado, vários lugares…, mas não os treinam a cantar sob arvoredos. Chega no torneio, se a estaca estiver sob uma árvore, o bichinho fica olhando pra cima, passa os 5 minutos e ele não canta. Se for muito bom, canta assim mesmo, mas a maioria estranha, e muito. Aí o dono põe no passarinho a culpa que é dele, que não treinou direito.

Se estou certo, não sei, mas tem leitura aqui pra passar o dia…

Valdemir Roberto Ribeiro de Barros

Escrito por Valdemir Roberto Ribeiro de Barros, em 26/8/2004

Em busca do canto perdido

Criadores de curió de Florianópolis

Criar curiós é paixão antiga para os manezinhos, como são conhecidos os florianopolitanos da gema, nascidos na ilha de Santa Catarina. Dizem até que, para reconhecer um deles, basta conferir se o sujeito tem o dedo indicador em forma de gancho, de tanto segurar na alça da gaiola para passear com o passarinho. A história é verdadeira apenas em parte. Qualquer passarinheiro de verdade e manezinho legítimo sabe que gaiola não se carrega pela alça com o dedo, mas pela base, com a mão espalmada. Sair com o curió faz parte do treinamento básico para os acirrados torneios de canto que volta e meia movimentam Florianópolis. ‘Curió é igual criança: fica faceiro quando sai para dar uma volta. Aí ele canta melhor, com mais alegria’, diz o criador Aldo Machado. ‘E o passarinho também precisa se acostumar com o mundo para não estranhar quando tiver de sair de casa para competir.’

CURIÓDROMO Torneios de canto de curió existem em todo o Brasil, do monte Caburaí (RR) ao Arroio Chuí (RS). Mas só em Florianópolis existe curiódromo, uma arena especialmente construída para abrigar esse tipo de competição em suas diversas modalidades. Além disso, os criadores de Santa Catarina estão conseguindo resgatar o canto nativo dos curiós que, até décadas atrás, ainda viviam em estado selvagem na faixa de Mata Atlântica que ia do município de Palhoça a Camboriú. Chamado de canto Florianópolis, ou canto Catarina, é tido como um dos mais belos sons que um curió pode emitir. E que por pouco não se perdeu. ‘O canto Florianópolis é mavioso, melodioso, agradável ao ouvido’, diz o ornitólogo Aloísio Pacini Tostes, um dos maiores especialistas em pássaros no país e presidente da Cobrap – Confederação Brasileira dos Criadores de Pássaros Nativos.

Segundo o criador Machado, curió é que nem criança. Fica faceiro quando sai para dar uma volta, e aí canta melhor

Para os entendidos, o canto Florianópolis tem duas características que o tornam tão especial. Uma é o que os criadores chamam de alteada de canto, um assovio em que o curió repete duas notas que mais ou menos se parecem com um ‘tiui-tiui’, algo único entre os cantos brasileiros. A outra característica é o arremate, apelidado de pandeirinho pelos aficionados, que pode ser traduzido como três assovios bem rápidos e curtos com os quais o passarinho encerra o canto, um ‘qui-qui-qui’ de deixar maravilhados os juízes das competições, pois nem todo curió consegue acertar essa parte do canto. ‘De tão difícil de o passarinho aprender, o pandeirinho é opcional, segundo o regulamento. É a cereja do bolo’, explica Dirço Amaral, dono do criadouro Biguaçu, feliz da vida com seus curiós Regente e Guri, capazes de executar o canto Florianópolis à perfeição, com ‘qui-qui-qui’ e tudo.

No Brasil chegaram a ser catalogados mais de 100 tipos de cantos regionais, como o Florianópolis, o Paranaguá, o Paracambi, o Vivi Tetéu e o Vovô Viu. Quando os curiós viviam em estado selvagem – situação que hoje praticamente só existe em algumas regiões do Norte e Nordeste – o canto se mantinha geração após geração. Mas cantos como o Florianópolis começaram a correr risco de extinção quando ficou mais fácil encontrar curió em gaiola do que na mata. Para formar bons competidores, os criadores punham os filhotes a ouvir cantos gravados em fitas cassete ou em CDs, para que os curiozinhos ouvissem direitinho como teriam de cantar. Acontece que, mais organizados, os criadores paulistas saíram na frente e impuseram ao país o chamado canto Praia Grande, originário do litoral de São Paulo, que logo se tornou padrão nacional. ‘Na verdade, o canto Praia se tornou uma grande indústria, que por pouco não engoliu os diversos cantos regionais’, diz Jorge Guerreiro Heusi, dono do Sítio do Curió, um dos criadouros especializados no canto nativo.

Publicado da Revista Globo Rural

Escrito por Gladinston Silvestrini, em 6/7/2004